terça-feira, 6 de agosto de 2019

O Presidente dos analfabetos:


Para criticar o Brasil de hoje e compreender o que está em jogo na política e na manipulação da política como forma de dominação econômica e simbólica, é necessário reconstruir uma totalidade alternativa que desconstrua o culturalismo racista conservador e reconstrua a sociedade brasileira em um sentido novo e crítico. Ao mesmo tempo, este esforço parece-me também fundamental para apontar os caminhos de uma nova crítica social entre nós que não se deixe colonizar pelo culturalismo conservador e seu racismo implícito.
É necessária uma reflexão independente, também acerca do Estado e da sociedade, para que o culturalismo conservador de direita não colonize a esquerda como acontece até hoje. Todos os golpes de Estado contra a esquerda se baseiam na dominância de uma interpretação totalizante e conservadora, que contamina e fragiliza a esquerda mortalmente. Para evitar que isso aconteça no futuro, é necessário desconstruir a leitura conservadora dominante e construir uma teoria explicativa nova tão abrangente quanto a versão conservadora o é. Daí a importância de as três questões essenciais a que toda religião ou ciência totalizadora ter que ser respondidas agora refletindo os interesses da crítica social que a “esquerda” pretende representar. Interesses que tenham a ver com a crítica da desigualdade e da injustiça social e não com sua reprodução. Para responder às três questões essenciais para a compreensão da singularidade de qualquer sociedade – de onde viemos, quem somos e para onde vamos –, o culturalismo racista constrói uma fantasia da continuidade cultural com Portugal que é falsa da cabeça aos pés.
No Brasil, desde o ano zero, a instituição que englobava todas as outras era a escravidão, que não existia em Portugal, a não ser de modo muito tópico e passageiro. Nossa forma de família, de economia, de política e de justiça foi toda baseada na escravidão. Mas nossa auto interpretação dominante nos vê como continuidade perfeita de uma sociedade que jamais conheceu a escravidão a não ser de modo muito datado e localizado. Como tamanho efeito de auto desconhecimento foi possível? Não é que os criadores e discípulos do culturalismo racista nunca tenham falado de escravidão. Ao contrário, todos falam. No entanto, dizer o nome não significa compreender o conceito. A diferença entre nome e conceito é o que separa o senso comum da ciência. Pode-se falar de escravidão e depois retirar da consciência todos os seus efeitos reais e fazer de conta que somos continuação de uma sociedade não escravista. É como tornar secundário e invisível o que é principal e construir uma fantasia que servirá maravilhosamente não para conhecer o país e seus conflitos reais, mas, sim, para reproduzir todo tipo de privilégio escravista ainda que em condições modernas. E, toque satânico, demonizar o Estado como repositório da suposta herança maldita portuguesa e sempre que o mesmo for ocupado pela esquerda e reverberar seletivamente a acusação moralista já.
 É precisamente como uma sociedade constitutiva e estruturalmente sadomasoquista – no sentido de uma patologia social específica, onde a dor alheia, o não reconhecimento da alteridade e a perversão do prazer transformam-se em objetivo máximo das relações interpessoais, tudo para honra e glória do senhor Jesus. A verdade, porém, é que nós é que fomos os sadistas; o elemento ativo na corrupção da vida de família; e moleques e mulatas, o elemento passivo. Na realidade, nem o branco nem o negro agiram por si, muito menos como raça, ou sob a ação preponderante do clima, nas relações de sexo e de classe que se desenvolveram entre senhores e escravos no Brasil. Exprimiu-se nessas relações o espírito do sistema econômico que nos dividiu, como um Deus todo-poderoso, em senhores e escravos. Dele se deriva a exagerada tendência para o sadismo característica do brasileiro, nascido e criado em casa-grande principalmente em engenho; e a que insistentemente temos aludido neste ensaio. Imagine-se um país com os meninos armados de faca de ponta! Pois foi assim o Brasil do tempo da escravidão.
Hoje o então Jair dos senhores, o representante de Deus a salvação dos protestantes, Senhor e Capitão do Mato para as minorias oprimidas de instituição pagã, que por sua própria irresponsabilidade e ignorância política assim elegeu de próprio punho o seu carrasco Inquisidor.
Viva o País do retrocesso cultural de Jair do fanatismo religioso.


Nenhum comentário: